Tal qual em Crônica de uma morte anunciada, livro de Garcia
Marquez que narra a reconstrução de um crime cometido ainda nas
primeiras páginas, o golpe agora assestado ao mandato
da Presidenta Dilma Rousseff e à frágil democracia brasileira, foi
também um crime anunciado.
Desde 2008, figuras renomadas da política neoliberal e conservadora
de âmbito global1
vêm-se reunindo em eventos que tiveram lugar em diversas cidades da
América Latina, com o objetivo de expandir os ideais do livre
mercado e ao mesmo tempo promover a formação e atuação de grupos
sociais de oposição aos governos progressistas da região e a
criação de um ambiente propicio para a derrubada desses governos
através do exercício midiático permanente. Algumas das mais
reconhecidas fundações2,
especialmente americanas e também europeias, apoiaram esses eventos,
como também foram auspiciantes dos movimentos “espontâneos” que
levaram cidadãos às ruas de São Paulo: o movimento Brasil Livre,
Vem pra Rua, Rebeldes Online e outros de apelo semelhante e também o
GDA – Grupo de Diários América 3.
Assim, a motivação para o golpe anunciado pouco teve de vingança
pessoal por parte de um bandido contrariado à frente da Câmara de
Deputados do país, ainda que isto também tenha acontecido e
alimentado uma fogueira que já estava acessa. A ofensiva neoliberal
e conservadora para o Brasil e a América do Sul especialmente já
está montada pelo grande capital e vai avançando pelos caminhos
possíveis, que podem ir desde eleições manipuladas até golpes
parlamentares ou policialescos.
Por estes motivos, fica claro que os verdadeiros motivos do golpe
radicam fundamentalmente na perspectiva já antiga da elite
brasileira de se aliar aos impérios de turno e aos grandes capitais,
e agora, na globalização, ao desejo de integrar as “cadeias
globais de produção”, como reivindicado fartamente pela FIESP. O
alinhamento subserviente da política externa brasileira à lógica
dos EUA e das grandes potencias e a regressão nos direitos e
conquistas socais serão as principais linhas estratégicas do
governo ilegítimo. De fato, as elites brasileiras nunca tiveram
grande apreço pela democracia, ainda quando ela parece o mais eficaz
e moderno sistema de governo, e por isso não têm o menor escrúpulo
em dar o golpe midiático – jurídico – policial de hoje, como
não o tiveram em 1964 para armar e sustentar o golpe militar.
Foi desses anos de trevas da ditadura que surgiu como principal
legado o atual PMDB, que foi criado e se mantém para ser o fiel da
balança de qualquer processo político no Brasil, e sem o qual, até
agora, ninguém conseguiu governar o país. Por isso, a corrupção
que existe no Brasil desde o tempo do estabelecimento do império
português, foi revigorada e atualizada para manter um partido
político que vive para ser base de sustentação de qualquer
governo, seja de esquerda ou de direita. A corrupção, estruturante
do sistema capitalista, torna-se assim mais grave ainda num sistema
político como o brasileiro, que por conta desse perverso mecanismo
chamado PMDB, precisa inventar o conhecido “presidencialismo de
coalizão”, que não é nada mais que lotear os ministérios para
irrigar fartamente as vontades e as votações de deputados e
senadores dos partidos aliados. Ao PT e a qualquer outro partido que
tente governar o Brasil sem uma verdadeira e profunda reforma
política, lhe corresponderá pagar o preço de “manter a
democracia funcionando”. Por isso, o argumento de varrer a
corrupção do país como motivo para afastar a presidenta Dilma,
soaria como piada, não fosse a argumentação tragicamente
manipulada pelos grandes meios de comunicação.
A este câncer histórico que é o PMDB devem-se somar a recente
aparição e crescimento do fundamentalismo religioso no país,
engordando a bancada BBB – “Boi, bala e bíblia” que completa o
baú dos horrores da política brasileira.
Este mix, convenientemente agitado, se juntou à tradicional
falta de cultura política e participativa do povo brasileiro que,
fruto de um perverso e doloroso sistema escravocrata, têm sido
mantido permanentemente afastado das resoluções das disputas de
poder, que ainda correspondem exclusivamente frações das elites
brancas e acomodadas. Esta cultura de afastamento do povo das
decisões políticas, ainda que pode soar radical tem sido a arma
com que as elites mantêm o controle popular:.. A população pobre
deste país ficou de fora do golpe, como sempre, e o apelo
desesperado de uma mulher falando para a presidenta: “Dilma:
resista por nós” é exemplo eloquente desse distanciamento.
Por isso, apesar dos inúmeros protestos e manifestações de repúdio
de importantes setores da classe média mais esclarecida, e até
mesmo apesar da denúncia da imprensa internacional, os golpistas
fincaram pé em um governo impresentável e inadmissível para o
século XXI: todos homens, ricos, brancos, velhos e ainda por cima
sem voto! Afora a grotesca e incoerente ficha suja no currículo da
maioria deles.
Assim, chegamos à verdadeira motivação do golpe fraudulento, que
não é mais que a restituição das políticas neoliberais que
estiveram ao menos parcialmente represadas pelo governo petista. Um
governo que conseguiu manter sem grandes mudanças uma legislação
trabalhista com garantias conquistadas faz muito tempo e também
alcançar alguma distribuição da renda com foco nas políticas
sociais, ao mesmo tempo em que iniciou políticas para avançar na
igualdade de gênero e favoreceu consideravelmente a expansão do
mercado interno, (ainda que sem questionamento ao modelo de
desenvolvimento extrativista injusto e ambientalmente predatório).
Também conseguiu impulsionar uma política externa de fortalecimento
do multilateralismo, baseado em novas relações de poder global,
ancoradas na integração regional e na conformação do Bloco dos
BRICS e seu respectivo NDB – Novo Banco de Desenvolvimento –,
buscando dessa forma um novo equilíbrio na ordem hegemônica global
que vinha favorecendo a conformação de uma governança global menos
desigual e unilateral. Por estas razões é que conseguimos
vislumbrar as verdadeiras motivações do golpe institucional
comandado pela dupla FIESP – PMDB, com o apoio dos partidos
conservadores, da mídia oligopólica, do Poder Judiciário (o mais
oligárquico dos três poderes) e do Poder Legislativo.
Apesar do governo petista não ter alcançado a mudar a cultura
política do país, dando realmente voz política aos pobres do campo
e da cidade, talvez o maior avanço alcançado, tenha sido permitir
esboçar a noção de direitos na população, até então excluída
da política pública que sempre chegou via os favores e as regalias
dos senhores e coronéis.
Foram criadas finas pontes e centelhas de consciência nas massas
populares... serão esses os fios com que será tecida a derrota do
golpe?
Fora os golpistas \ Pela recondução do governo legítimo da
Presidenta Dilma Rousseff
INSTITUTO EQUIT \ 18 de maio 2016.
1
http://www.pagina12.com.ar/diario/elpais/1-216705-2013-03-27.html
/
figuras da direita ibero-americana se reuniram em Rosário, dentre
eles o
escritor Mario Vargas Llosa, seu filho Alvaro, o ex presidente
espanhol José María Aznar, a blogueira cubana Yoani Sánchez, a
presidenta do Partido Popular de Madri Esperanza Aguirre, o ex
presidente boliviano Jorge “Tuto” Quiroga e o ex mandatário de
Uruguai Luis Lacalle, festejando os 25 anos da neoconservadora
Fundação Liberdade de Rosário. Em Buenos Aires tiveram o auspicio
de Mauricio Macri que lhes emprestou um salão no Teatro Colón para
o coquetel de fechamento do encontro.
2
Fundações tais como a Friedrich Naumann, o CATO Institute, a
Student for Liberty e o Atlas, com a participação local do
Instituto Millennium e outros. A Students
for Liberty é uma entidade financiada pelos irmãos Koch,
notoriamente conhecidos por influenciar a política dos EUA através
dos seus candidatos ao Congresso estadunidense, financiar as
universidades para o seus interesses através de uma rede de think
tanks e ONG'S para privatizar a o sistema educacional norte
americano e contestar a tese do aquecimento global. Eles são donos
da Koch Industries, uma das maiores empresas privadas na área de
petróleo dos EUA e financiadores do Tea Party.
http://youtube.com/watch?v=6D3...
3
GDA – Grupo de Diários America formado por influentes jornais
como O
Globo em Brasil, Clarín em Argentina, El Comercio em Peru, El
Mercurio em Chile, El Tiempo em Colombia, etc.